terça-feira, 1 de julho de 2008

Lie Down in the Light, de Bonnie "Prince" Billy

Por Ricardo Gomes

Estadunidense de Louisville, Will Oldham é certamente uma pequena dor de cabeça para os catalogadores de artistas de americana e ritmos afins. Dos catorze álbuns de estúdio que lançou desde que deu início à carreira, em 1993, apenas um - Joya - trazia na capa o seu nome verdadeiro. Todo o restante foi apresentado sob pseudônimos, como os da série Palace (Palace Music, Palace Brothers, Palace Songs) e, mais recente e numerosamente, o aclamado Bonnie "Prince" Billy.

Foi gravando pela primeira vez como Bonnie, em 1999, que Oldham conseguiu aquele que é tido como o seu grande momento, o álbum I See a Darkness. Poderoso e angustiante, o conteúdo do disco muito faz justiça ao título que leva: todo ele é situado em territórios sombrios, escuros, de beleza cinzenta e sorumbática. À época, houve quem, na crítica, dissesse até que aquilo não podia tratar-se de música. Era algo além dela. Um ano depois, o incontornável Johnny Cash interpretou a faixa nominal no seu American III. E o que escreve estas maltraçadas mal pode escutar hoje as primeiras notas de Death to Everyone, por exemplo, sem sentir algo se deslocar entre as costelas.

Eis que, sete compactos e quase uma década mais tarde, em maio deste ano, sai aquele que tem sido chamado de consorte luminoso do I See a Darkness. Lie Down in the Light, é verdade, obedece tão bem ao nome que lhe deram quanto o seu suposto irmão atormentado - e por isso é com certeza um ponto dissonante no repertório de Billy. Opondo-se não só a Darkness, mas também a outros registros de sucesso, como Viva Last Blues, os tons vocais e intrumentais que aqui aparecem são mais limpos e acessíveis do que em qualquer outro trabalho de Will Oldham. O músico não deixou a veia lo-fi rock desaparecer exatamente, mas é inegável o espaço que esta cedeu a outras temáticas suas, nomeadamente o gospel e o country.

A música de abertura, Easy Does It, é um aviso: há mudança por esses lados. Aventurando a garganta com eficácia por toadas inesperadamente agudas, Bonnie "Prince" Billy traça uma enérgica canção onde a sua face western avança em peso, e sem sinal de recuo. Ao sempre presente caráter de improviso e simplicidade da discografia dele são adicionados agora vários outros elementos - na compassada You Remind Me of Something (The Glory Goes), como em outras que a seguem, um providencial violino confirma a nova tônica que o álbum propõe.

Os pontos altos são vários: as músicas acompanhadas por Ashley Webber, como a excelente You Want That Picture, funcionam muito bem; For Every Field There's a Mole, composição que acopla um matiz de jazz a uma atmosfera religiosa, é decerto um dos melhores temas de todo o CD; os arranjos e a intensidade de Willow Trees Bend são dos mais comoventes que se pode ouvir por esses tempos. Todo o disco, enfim, acaba se firmando como uma unidade, e os instantes à primeira vista não tão atraentes ainda assim convidam a audições posteriores. Esse conjunto, apesar de ser revigorante e de fato uma das melhores produções de seu autor, não consegue, entretanto, atingir as dimensões daquele anterior já clássico, o I See a Darkness. Talvez justamente por se aproximar de sons de certa forma mais abertos - lúcidos -, ele não vai precisamente "além", continua ainda sendo "música" - mas, fique claro, música de uma qualidade que não se vê facilmente por aí.

Imagem1: http://ecx.images-amazon.com/
Imagem2: http://www.killerofgiants.com/

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